sexta-feira, 12 de junho de 2009

VILAS VOLANTES - Palavras sopradas

Por Sâmila Braga


A história contada por aqueles que a vivem. Lembranças dos conhecidos, a maioria já de “finados”. Cada ponto que compôs a cidadela que agora não mais existe. Quem vê os dois ali apontando para o nada pode até pensar que se trata de um autismo coletivo, ou que a velhice já extinguiu a lucidez. Todavia a memória não falha e os nomes vêm. E junto com eles mais estórias de passados e de vidas que agora estão sob a areia. As dunas movidas pelo vento movimentam-se descobrindo e encobrindo vilas. A medida que elas se aproximam, os moradores migram para lugares diversos. A igreja, a mercearia, as casas dos pescadores. A fome das dunas ao sabor dos ventos devora tudo. E os viventes vão buscar outro lugar que os dê abrigo, até a próxima duna.

No premiado documentário de Alexandre Veras, os cenários se misturam com a narrativa oral. O fenômeno do deslocamento de vilas, nas cinco cidades do interior do Ceará, é palco dos discursos dos personagens.O pescador, o construtor de barcos, a senhora que expõe as semelhanças entre o pequeno ser que cultiva na mão, achado por ali pelo mar, e o animal que deu o nome ao bichinho, o cavalo.

Cada cena é como uma pintura. Se congelamos as cenas, as fotos resultantes são belas e suplicantes de contemplação. O mangue, o garoto que corre sob duas rodas nas dunas, ou mesmo o senhor-pescador que parece vai ser engolido pela parede de areia á sua frente, como quando está no mar e a parede que enfrenta é de água e sal.

Um pequeno filme. Um retrato, vários retratos.

Nossos parabéns a poesia de imagem em movimento. O movimento dos ventos, das dunas, das gentes, das histórias.

Confira galeria de fotos, com os quadros-momentos:


quinta-feira, 4 de junho de 2009

A PESSOA É PARA O QUE NASCE - A luz de quem vive na escuridão

Pormila Braga

A pessoa é para o que nasce ...


Três irmãs, um destino. Repleto pela música, pelo tocar do ganzá, pelo barulho das moedas caindo, pela escuridão. Pediam esmolas desde que eram adolescentes. Pelo canto sobreviviam. A moléstia congênita que teimou em encarnar nas três mulheres. Se explica, como elas imaginam, pelos laços sanguíneos entre a mãe e o pai. Eram primos. Mas o mal pode transformar. A união faz delas uma só. Dormindo, acordadas ou cantando. Vidas unidas pela falta da luz. As vozes graves passaram a encantar o Brasil. Porque a pessoa é para o que nasce! Encantaram Gil, o público e o expectador do filme de Berliner. Esse inclusive, é o alvo de uma amor confundido de Maria, a do meio. Ela teima em perseguir o amor. Já casou por duas vezes. Na primeira, o marido – repentista – a maltratava, mas deixou-lhe uma estrela. Dalva. Na segunda, diz que o esposo era bom sem precedentes. Mataram-no pelas costas á facadas. E junto com ele mais uma luz de Maria findou. Ficou só novamente. Com o filme, o diretor a fez reconceber sentimentos. Novamente, desilusões. Ao som de um música brega-anos 90, tocada num rádio velho. Depois viu a esposa e o filho daquele que achara ser seu amado.

A mais nova da irmãs recebeu as graças de uma marca. Marca da fonte da vida, a água. Chama-se Indaiá. Já Poroca (Conceição) é o nome que se apegou a mais velha. Todas são retratadas num belo documentário que desnuda um cotidiano simples de três mulheres-guerreiras da vida da Paraíba. Com o filme, se tornam aquilo que não podem ver. Luz, estrelas de cinema. O que lhes traz muita alegria. Ingenuidade nas palavras, nos pedidos, nas histórias. Fazem de Maria, Conceição e Indaiá pedaços firmes-leves da cultura popular nordestina brasileira.


A nudez que fecha o filme talvez queira transmitir a pureza escondida nos corpos que sequer podem ver. As cores, as formas e a malícia dos homens. Justa e célebre homenagem de Berliner às irmãs, à cultura.


segunda-feira, 1 de junho de 2009

Junho: Nordeste no Cine Fa7



Junho é o mês em que, sem sombra de dúvida o nordestino se sente orgulhoso de aqui ter nascido. Uma explosão de cores, de tradições e de imagens, inundam as cidades, as lojas. Os meios de comunicação parecem se voltar para esta terra, esquecida durante os outros meses do ano.Ser nordestino, como disse Euclides da Cunha, é ser acima de tudo, um forte. E esta frase pode ser aplicada também quando se fala em audiovisual e cinema.

São várias as dificuldades encontradas para os que, na região tentam produzir seus vídeos, documentários e filmes de curta,média e longa metragem. Mas apesar dessas barreiras, muito é feito por aqueles que "com gosto de sangue na boca" se arriscam a produzir, tendo muitas das vezes que arcar com os próprios custeios de produção e edição dos projetos. E no Ceará a situação não é menos preocupante, há vários anos vem-se tentando fortalecer o movimento no estado, à base de muita força de vontade e atenção do governo do estado.

Para este mês, em que pretendemos mostrar um mínimo do que já foi feito por nossos diretores teremos três visões diferentes: à partir do Ceará, com o premiado diretor Alexandre Veras e suas Vilas volantes- o verbo contra o vento (10/6) , trazendo uma mostra de como as histórias são repassadas oralmente pelos mais velhos. A pessoa é para o que nasce (3/6), traz uma visão iluminada de três irmãs cegas da Paraíba que, com muito talento, demonstram a vontade de viver através da música. Viva São João é um típico "documentário/clipe" em que Gilberto Gil vive aquele sujeito que já não sabe mais como ser nordestino e observa "de fora" aquilo que já não possui, a nordestinidade.

São por esses e outros motivos que o Cine FA7 encerra suas atividades no semestre com este tema tão rico e sedutor. Para os que vão às sessões, o certo é que não se arrependerão, pois estarão vivenciando a cultura de sua terra, de suas raizes através dos três documentários que encherão os olhos do seleto grupo que acompanha o Cine FA7 toda quarta às 11h na sala 53B.